Um dia um doutor portou lá por causa da chuva e espantou-se de tanta miséria. Vendo o caboclo tão amarelo e chucro, resolveu examiná-lo.
          "Amigo Jeca, o que você tem é doença."
          "Pode ser. Sinto uma canseira sem fim, e dor de cabeça, e uma pontada aqui no peito que responde na cacunda."
        "Isso mesmo. Você sofre de anquilostomiase."
        "Anqui... o quê?"
        "Sofre de amarelão, entende? Uma doença que muitos confundem com a maleita."
        "Essa tal maleita não é a sezão?
        " Isso mesmo. Maleita, sezão, febre palustre ou febre intermitente: tudo é a mesma coisa, está entendendo? A sezão também produz anemia, moleza e esse desânimo do amarelão; mas é diferente. Conhece-se a maleita pelo arrepio, ou calafrio que dá, pois é uma febre que vem sempre em horas certas e com muito suor. O que você tem é outra coisa. É amarelão."
O doutor receitou-se o remédio adequado; depois disse:
"E trate de comprar um par de botinas e nunca mais me ande descalço nem beba pinga, ouviu?"
          "Ouvi, sim, senhor!"           
          "Pois é isso, rematou o doutor, tomando o chapéu. A chuva passou e vou-me embora. Faça o que mandei, que ficará forte, rijo e rico como o italiano. Na semana que vem estarei de volta."
         "Até por lá, sêo doutor!" 
           Jeca ficou cismando. Não acreditava muito nas palavras da ciência, mas por fim resolveu comprar os remédios, e também um par de botinas ringideiras.
Nos primeiros dias foi um horror. Ele andava pisando em ovos. Mas acostumou-se, afinal...
Quando o doutor reapareceu, Jeca estava bem melhor, graças ao remédio tomado. O doutor
mostrou-lhe com uma lente o que tinha saído das suas tripas.
          "Veja, sêo Jeca, que bicharia tremenda estava se criando na sua barriga! São os tais anquilostomos, uns bichinhos dos lugares úmidos, que entram pelos pés, vão varando pela carne adentro até alcançarem os intestinos. Chegando lá, grudam-se nas tripas e escangalham com o freguês. Tomando este remédio você bota p'ra fora todos os anquilostomos que tem no corpo. E andando sempre calçado, não deixa que entrem os que estão na terra. Assim fica livre da doença pelo resto da vida."
         Jeca abriu a boca, maravilhado.
         "Os anjos digam amém, sêo doutor!"
        Mas Jeca não podia acreditar numa coisa: que os bichinhos entrassem pelo pé. Ele era "positivo" e dos tais que "só vendo". O doutor resolveu abrir-lhe os olhos. Levou-o a um lugar úmido, atrás da casa, e disse:
         "Tire a botina e ande um pouco por aí."           
        Jeca obedeceu.
       "Agora venha cá. Sente-se. Bote o pé em cima do joelho. Assim. Agora examine a pelacom esta lente".
      Jeca tomou a lente, olhou e percebeu vários vermes pequeninos que já estavam penetrando na sua pele, através dos poros. O pobre homem arregalou os olhos assombrado.
       "E não é que é mesmo? Quem "havera" de dizer!..."
       "Pois é isso, sêo Jeca, e daqui por diante não duvide mais do que a ciência disser.
Nunca mais! Daqui por diante nha ciência está dizendo e Jeca está jurando em cima! T'esconjuro! E pinga, então, nem p'ra remédio..."
Tudo o que o doutor disse aconteceu direitinho! Três meses depois ninguém mais conhecia o Jeca.